*Destaque, Opinião, Política Entre a técnica e a política: desafios na montagem de governos

A escolha dos nomes que compõem as pastas governamentais vai muito além de uma mera formalidade administrativa. Trata-se de um exercício estratégico que busca, simultaneamente, a competência técnica para implementar políticas públicas eficazes e a habilidade política para manter a governabilidade e viabilizar projetos eleitorais e de gestão. Os recentes episódios vivenciados nos governos federal e municipal – com a nomeação de Gleisi Hoffmann por Lula e a decisão de Sandro Mabel de manter uma pasta sem titular em Goiânia – ilustram de maneira emblemática os dilemas e desafios desse processo.

Competência X política

Em qualquer administração, a escolha dos secretários e ministros é pautada por dois eixos fundamentais. Por um lado, há a necessidade de selecionar profissionais com profundo conhecimento e experiência na área específica de cada pasta, garantindo que as políticas públicas sejam formuladas e implementadas de forma eficaz. Por outro, o contexto político exige a construção de pontes e a consolidação de uma base de apoio que permita a articulação com diferentes forças e setores, sobretudo em um cenário de maioria legislativa que pode ser adversa.

Essa tensão é evidente tanto no governo federal, sob a liderança de Lula, quanto nas administrações municipais. Enquanto a expertise técnica é essencial para o sucesso operacional do governo, a capacidade de negociar e articular alianças é determinante para a sobrevivência e continuidade de um projeto governamental.

Gleisi Hoffmann e a articulação para Lula

A escolha de Gleisi Hoffmann para comandar a Secretaria de Relações Institucionais é um exemplo claro dessa aposta no equilíbrio entre técnica e política. Nomeada pelo presidente Lula – cuja posse está prevista para 10 de março de 2025 – Hoffmann traz consigo uma bagagem política sólida, tendo atuado como chefe da Casa Civil no governo Dilma Rousseff. Sua nomeação é estratégica: em um ambiente em que o Congresso detém maioria conservadora, a experiência e a habilidade de negociação de Hoffmann são vistas como fundamentais para articular o diálogo entre o Executivo e o Legislativo.

Contudo, a indicação não fugiu das críticas. Setores da oposição expressaram reservas quanto ao seu alinhamento ideológico, questionando se sua postura firme será capaz de dialogar com forças políticas de espectros tão diversos. Essa polarização evidencia a complexidade de se conciliar os interesses partidários e a necessidade de se estabelecer uma ponte que favoreça a aprovação de pautas essenciais para o país.

A incerteza em Goiânia: A pasta sem titular

No cenário municipal de Goiânia, o prefeito Sandro Mabel tem seguido uma linha de cautela na composição de seu secretariado. Embora já tenham sido anunciados nomes que atendem a diagnósticos técnicos realizados por sua equipe de transição, uma decisão chamou a atenção: a manutenção da Secretaria de Eficiência sem titular, mesmo após 40 dias de gestão e a desistência do vereador Lucas Kitão (UB) em assumir a pasta.

Essa escolha, que pode refletir uma busca por um perfil técnico minuciosamente selecionado, gera, contudo, inquietação. A ausência de um líder definido para uma pasta estratégica pode comprometer a eficácia na implementação de políticas voltadas à otimização dos serviços públicos, além de transmitir uma imagem de incerteza e de atraso na articulação administrativa. Em um contexto onde a agilidade e a precisão na resposta às demandas da população são essenciais, essa lacuna pode se transformar em um ponto vulnerável para a administração municipal.

Reflexões sobre governabilidade e impacto na sociedade

Ambos os casos – a escolha de Gleisi Hoffmann e a pasta sem titular em Goiânia – ressaltam o delicado equilíbrio que os governos precisam manter entre competência técnica e habilidade política. Enquanto a experiência e o conhecimento setorial garantem a operacionalização eficiente dos serviços públicos, a capacidade de construir alianças e articular interesses é indispensável para a continuidade de um projeto de governo, especialmente em contextos de forte polarização política.

Para os cidadãos, essas decisões reverberam de maneira direta. Secretários e ministros bem escolhidos podem traduzir-se em políticas públicas eficazes e em uma gestão que responde às necessidades reais da sociedade. Por outro lado, a ausência ou a escolha controversa de titulares pode resultar em atrasos, ineficiências e, consequentemente, na deterioração da confiança popular nas instituições governamentais.

O melhor caminho

A montagem de um governo eficaz é um ato de equilíbrio e sensibilidade política. A escolha dos nomes que compõem o secretariado – seja a aposta de Lula em Gleisi Hoffmann para articular o diálogo com um Congresso conservador ou a cautela de Sandro Mabel ao deixar uma pasta estratégica sem titular – revela os desafios intrínsecos à gestão pública no Brasil. O verdadeiro desafio reside em construir equipes que unam o rigor técnico à habilidade de articulação política, transformando desafios em oportunidades e promovendo, de maneira efetiva, o bem-estar da população. Afinal, o equilíbrio entre técnica e política não é apenas uma estratégia administrativa, mas um imperativo para o fortalecimento da democracia e a melhoria da qualidade dos serviços públicos.

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